RPCD, 2022, S1
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RPCD 2022/S1Editorial
O projeto REACT

O presente número especial da Revista Portuguesa de Ciências do Desporto (RPCD) é consagrado exclusivamente ao projeto REACT, o qual, como facilmente se percebe ao longo da leitura deste documento, procura recolher um significativo conjunto de informação referente a uma determinada comunidade (no caso vertente, à residente em Matosinhos), em diversos níveis e enquadramentos, para, com base na sua análise profunda e detalhada, produzir conhecimento, posteriormente devolvido à referida comunidade, visando a melhoria da sua qualidade de vida.

Desse modo, para além do seu elevado mérito intrínseco, este projeto constitui-se igualmente como um exemplo de algo que, felizmente, cada vez mais tem vindo a acontecer e que consiste na desejável relação entre o que é realizado na Universidade e o que sucede no quotidiano das comunidades nas quais se inserem e que as suportam. Em conformidade, dando sequência à solicitação do coordenador do REACT, Prof. Doutor José Maia, este número especial da Revista Portuguesa de Ciências do Desporto é dedicado a todas as crianças do 1º ciclo do ensino básico do concelho de Matosinhos, e por extensão a todas as crianças do país que sofreram na pele as agruras dos confinamentos provocados pela Covid-19.

 Na verdade, quando atentamos à origem e nascimento das instituições universitárias, verificamos que remontam, pelo menos, aos princípios do século XII (atendendo a que o termo universitas foi utilizado pela primeira vez pela Universidade de Bolonha, fundada em 1088), pese embora já antes terem existido instituições destinadas à propagação do conhecimento, designadamente na Grécia Antiga (e.g., a Academia de Platão, a Stoa dos filósofos estóicos; o Liceu de Aristóteles); todavia, também não é menos verdade, que, de uma forma geral e por muitos anos, uma das suas caraterísticas foi a do seu relativo isolamento em relação à sociedade em geral.

 Felizmente, as pressões internas e externas à Universidade para que esta situação se alterasse, dando origem a relações mutuamente vantajosas e que permitissem melhorar a qualidade de vida das comunidades em geral, foram aumentando exponencialmente, em particular ao longo dos últimos anos.

 No caso concreto da nossa Faculdade, felizmente, o panorama foi sempre substancialmente distinto do antes referido, porquanto, desde o início da sua criação (naturalmente muito mais recente, porquanto não decorreram ainda cinco décadas desde esse momento), foram sempre múltiplas e diversificadas as situações que originaram interessantíssimas e profícuas relações de colaboração e benefício mútuo, com pessoas e instituições externas à academia, operando em diferentes domínios (e.g., escolas, instituições de saúde, de solidariedade social, clubes desportivos, associações, federações, autarquias, órgãos de governo regional ou nacional, empresas, agremiações), tanto em Portugal como no estrangeiro. De facto, o diversificado e consistente padrão de interrelações, colaborações e partilhas com outras instituições tem sido, e continuará certamente a ser, uma marca identitária da nossa Faculdade, constituindo-se como um agente fundamental para a consecução da sua missão.

 Mais especificamente no que se refere a situações relativamente semelhantes à do REACT, que requerem um intrincado conjunto de colaborações e cumplicidades entre pessoas (investigadores, professores, alunos, famílias) e instituições (Universidade, Câmara Municipal, Agrupamentos de Escolas) e cujo sucesso é inexoravelmente determinado pela dinâmica criada pelos seus protagonistas e pelo modo como conseguem congregar todas essas pessoas e instituições em torno de uma visão comum, felizmente que no passado também existiram e foram coroadas de sucesso, razão pela qual a nossa expectativa em relação ao REACT era, e é, naturalmente elevada.

 Mas, recordando o alerta de que, “para dançar o tango são necessários dois”, importará relevar que, para além da vontade, competência e disponibilidade para esse efeito, por parte da Faculdade de Desporto em geral, e da equipa coordenada pelo Prof. Doutor José Maia, em particular, era imprescindível que, da parte da comunidade, designadamente de quem tem poder decisório, houvesse o mesmo entendimento, o que, felizmente, aconteceu, de um modo que muito nos orgulha e faz sentir reconhecidos.

 De facto, foi particularmente evidente que, da parte da Presidente da Câmara de Matosinhos, Dra. Luísa Salgueiro, coadjuvada pelo Prof. António Correia Pinto (Vereador da Educação e da Aprendizagem ao longo da Vida da Câmara Municipal de Matosinhos) e Dr. Vasco Pinho (Vereador do Desporto e Associativismo Desportivo da Câmara Municipal de Matosinhos), conforme se poderá perceber pela leitura das suas palavras, insertas no presente editorial, o entendimento foi similar: para além de ser patente a primazia atribuída a questões como “o desenvolvimento global, multilateral e harmonioso, necessário para a saúde física e mental, qualidade de vida e bem-estar das nossas crianças”, é igualmente percetível a sua visão e lucidez ao reconhecerem que projetos como o REACT podem constituir-se como “uma ferramenta de extrema importância na aferição dos efeitos pós-pandemia, que permitirá que as famílias, os professores de Educação Física, os treinadores e toda a comunidade tenham a perceção das consequências que a pandemia teve no crescimento, desenvolvimento motor e comportamentos de saúde das crianças do 1º ciclo das escolas do concelho de Matosinhos.”

 Ou seja, associada à sempre elogiável atenção a questões tão importantes para as comunidades que os elegeram, como sejam as relativas ao seu desenvolvimento e bem-estar físico e mental, e ao salutar entendimento da importância que a prática desportiva e do exercício físico pode assumir nesse sentido, em particular quando sofremos as consequências de uma crise que limitou fortemente aquela prática, emerge igualmente a não menos apreciável visão, e por isso mesmo merecedora de reconhecimento e louvor públicos, de que é importante que as decisões políticas que a todos dizem respeito sejam devidamente suportadas por conhecimento científico.


A Autarquia de Matosinhos tem vindo a projetar as suas competências enquanto concelho Educador, promovendo a equidade no acesso a uma educação de qualidade.

Os primeiros anos de vida são basilares no desenvolvimento e crescimento das crianças e, nesse âmbito, o papel da escola e da família aliam-se para que sejam criadas as condições ideais e essenciais para o bem-estar dos nossos jovens.

Com o surgimento da pandemia COVID-19, houve a necessidade premente de ajustar a vida de todos nós, a escola não fugiu a essa nova realidade dando lugar, em alguns momentos, à introdução de outras modalidades de ensino não presenciais - o ensino online e/ou misto. A saúde física e a saúde mental foram afetadas, quer pela falta de contacto presencial, quer pela aquisição de novos hábitos. As crianças passaram a ter uma vida mais sedentária, muitas delas sem possibilidade de ter acesso a qualquer tipo de prática de exercício físico, muitas vezes aliado ao facto de terem alterado os hábitos alimentares (pelas mais diversas razões) e também as rotinas de sono. É reconhecido por todos que a Educação Física nas escolas proporciona às crianças a prática de atividade física regular, bem como a adoção de hábitos de vida saudável, sendo essencial para o seu desenvolvimento.

O “Projeto REACT – De volta à ação” surge assim como uma ferramenta de extrema importância na aferição dos efeitos pós-pandemia, que permitirá que as famílias, os professores de Educação Física, os treinadores e toda a comunidade tenham a perceção das consequências que a pandemia teve no crescimento, desenvolvimento motor e comportamentos de saúde das crianças do 1º ciclo das escolas do concelho de Matosinhos.

Dra. Luísa Salgueiro, Presidente da Câmara Municipal de Matosinhos


O primeiro ano da implementação do projeto REACT trouxe um importante contributo no olhar abrangente e multifacetado que é necessário fazer sobre o desenvolvimento motor das crianças, apoiando-nos nos saberes, metodologias e tecnologia mais atuais.

Após anos de implementação da Escola a Tempo Inteiro, Matosinhos desenvolveu o currículo da Educação Física, no âmbito das Atividades de Enriquecimento Curricular, transversalmente do pré-escolar ao 4.º ano de escolaridade, onde são mobilizados os perfis de competência à saída da escolaridade obrigatória e articuladas as aprendizagens essenciais. Destacamos, entre outras, as modalidades de natação, patinagem, hóquei em patins, golfe, rope skipping, surf e bodyboard.

A partir da oportunidade que o projeto REACT nos está a proporcionar, cabe à autarquia (re)organizar, desenvolver e inovar as várias dimensões do Currículo Local da Educação Física e Modalidades Desportivas Locais. No centro deste processo, estarão os professores das atividades de enriquecimento curricular (EF&MDL) que, sob tutela da autarquia, serão envolvidos, em conjunto com a Faculdade de Desporto da Universidade do Porto, os professores titulares de turma e os Agrupamentos de Escolas, na análise crítica e apresentação de sugestões de melhoria. Esta ação tem como principais objetivos introduzir alterações nos modelos de ensino que potenciem o desenvolvimento motor dos/as alunos/as.

Pretendemos, assim, garantir a evolução positiva das aptidões físicas, nas suas diversas dimensões, elevação das capacidades físico-motoras e, simultaneamente, promoção pelo gosto da prática regular de atividade física dos/as nossos/as alunos/as.

Só desta forma é possível garantir o desenvolvimento global, multilateral e harmonioso, necessário para a saúde física e mental, qualidade de vida e bem-estar das nossas crianças.

Prof. António Correia Pinto, Vereador da Educação e da Aprendizagem ao longo da Vida da Câmara Municipal de Matosinhos


A conjuntura singular e os desafios coletivos que histórica e estoicamente atravessamos recentemente fazem, com a devida associação, deste documento um modelo único cujos estudos, análises e comentários servirão, estou seguro, de ponto de partida para uma reflexão profunda e, como se espera, para o desenvolvimento de pontes para novas abordagens e metodologias.

No âmbito do projeto REACT, superiormente coordenado pelo Professor Doutor José Maia, e pela FADEUP, a quem saúdo por todo o trabalho desenvolvido e agora plasmado neste livro, para além do exposto no congresso realizado em novembro de 2021, que elenca diversos motivos que alicerçam a verdade incontornável de que é premente “olhar em frente” e trabalhar no retorno à prática regular e consistente da atividade física, não só, mas também pelas novas gerações de Matosinhos, e em prol da restante comunidade.

Pese embora o enorme esforço dos profissionais de educação, em particular das Atividades de Enriquecimento Curricular (AEC), mormente os professores/as de Educação Física e Modalidades Desportivas Locais, durante o ensino remoto online e após o retorno ao ensino presencial, é importante impulsionar, ainda mais, a prática de exercício físico. O Município encontra-se dotado de equipamentos de excelência para a prática de desporto (quer na dimensão informal, quer na vertente federada) e tem uma política muito forte no incentivo e promoção de hábitos de vida saudáveis, dos quais fazem parte o exercício físico regular.

Assumindo a genuína preocupação que esta área adquire, por parte da autarquia de Matosinhos, as políticas aplicadas consideram o incentivo e promoção de hábitos de vida saudáveis pilares de desenvolvimento das comunidades, principalmente dos jovens em idade escolar.

Sobretudo é de ressalvar que, perante variáveis contextuais tão complexas, o crescimento e o desenvolvimento saudável das crianças e jovens é uma responsabilidade de todos e de todas. A Câmara Municipal de Matosinhos assume e continuará a assumir, como sempre fez, um papel central neste desígnio, sempre em parceira com os múltiplos agentes que se encontram no terreno e também através dos instrumentos que tem ao seu dispor, nomeadamente da política educativa e desportiva local.

Dr. Vasco Pinho, Vereador do Desporto e Associativismo Desportivo da Câmara Municipal de Matosinhos


 As palavras e a postura dos protagonistas deste projeto revelam igualmente um outro aspecto que importará destacar, e que consiste no modo atento, empenhado e competente como têm acompanhado a sua implementação mas também o têm monitorizado, procurando sempre adequá-lo e conformá-lo à realidade e visando construir o necessário conhecimento e condições que permitam a promoção e ocorrência de mudanças consistentes nos comportamentos dos seus destinatários, com todas as vantagens daí decorrentes para todos.

 Em suma, conforme inicialmente referido, o projeto REACT, que este número especial da RPCD procura dar a conhecer a outros públicos, é um exemplo de como a Universidade e outras instituições da sociedade em geral podem e devem cooperar no sentido da melhoria das condições de vida das comunidades das quais fazem parte e que lhes deram origem, esperando-se, portanto, que se constitua como um exemplo a seguir noutros momentos e contextos.

António Manuel Fonseca

 

ARTIGOS
Papers

Introdução
Carla Santos, Ricardo Santos, Sara Pereira, Rui Garganta,Olga Vasconcelos, Cláudio Farias, Fernando Garbeloto, Go Tani, Peter Katzmarzyk, José Maia

Aspetos metodológicos do projeto REACT
José Maia, Sara Pereira, Eduardo Guimarães, Carla Santos, Rui Garganta, Olga Vasconcelos, Cláudio Farias, Fernando Garbeloto, Go Tani, Peter Katzmarzyk

Sobre o crescimento das crianças Matosinhenses
Sara Pereira, Carla Santos, Rui Garganta, Olga Vasconcelos, Cláudio Farias, Fernando Garbeloto, Go Tani, Peter Katzmarzyk, José Maiaa

Prevalências de sobrepeso e obesidade
Sara Pereira, Renata Lucena, Rui Garganta, Olga Vasconcelos, Cláudio Farias, Fernando Garbeloto, Go Tani, Peter Katzmarzyk, José Maia

Sobre o desenvolvimento das habilidades motoras fundamentais das crianças Matosinhenses
Fernando Garbeloto, Matheus Maia, Sara Pereira, Rui Garganta, Olga Vasconcelos, Cláudio Farias, Fernando Garbeloto, Go Tani, Peter Katzmarzyk, José Maia

Níveis de atividade física, prática desportiva e tempo de sono
Renata Lucena, Sara Pereira, Priscyla Praxedes, Ricardo Santos, Rui Garganta, Olga Vasconcelos, Cláudio Farias, Fernando Garbeloto, Go Tani, Peter Katzmarzyk, José Maia

A aptidão física das crianças Matosinhenses
Priscyla Praxedes, Carla Santos, Eduardo Guimarães, Sara Pereira, Rui Garganta, Olga Vasconcelos, Cláudio Farias, Fernando Garbeloto, Go Tani, Peter Katzmarzyk, José Maia

Educação física no 1.º CEB de Matosinhos: Organização e infraestruturas
Ricardo Santos; Cláudio Farias, Renata Lucena, Sara Pereira, Rui Garganta, Olga Vasconcelos, Fernando Garbeloto, Go Tani, Hugo Cruz, Peter Katzmarzyk, José Maia

Recomendações
José Maia, Sara Pereira, Carla Santos, Renata Lucena, Eduardo Guimarães, Matheus Maia, Ricardo Santos, Priscyla Praxedes, Rui Garganta, Olga Vasconcelos, Fernando Garbeloto, Go Tani, Cláudio Farias, Peter Katzmarzyk